Dmitri em Niterói
Com ele já havíamos viajado pelos Estados Unidos das proibições dos anos 20 e descoberto códigos para entrar nos bares ilegais de Nova Iorque. Dançamos o Charleston! Ele já havia também nos apresentado seu mestre Michel Fokine, que revolucionou a dança clássica com a coreografia “A Morte do Cisne”, “O Espectro da Rosa” e outras que foram a chave para a dança nunca mais parar de se recriar.
Os anos 30 chegaram e era hora de dançar a Europa; descobrir como a música impressionista de Debussy, seu favorito, havia tocado a dança do Fauno Nijinsky. E lá fomos todos nós de navio para a Europa, com um gatinho.
A Inglaterra primeiro!
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Dmitri - foto do arquivo de Paulo Pinagé |
Foram muitas histórias contadas nos poucos minutos espremidos entre a barra, os saltos, piruetas e arabesques do centro, não necessariamente na ordem cronológica. O aquecimento das aulas de dança moderna era algo que nunca tínhamos experimentado em nossas aulas de Educação Física da Escola. De algum modo especial para cada um de nós, aquelas aulas nos inspiravam de tal modo que ser bailarina(o) nos parecia ser a coisa mais importante e certa a ser feita. Estávamos felizes, unidas(os) e orgulhosas(os) de nós. Nada parecia impossível.
Como ele diria, “O mundo é meu!” Este sentimento é inesquecível.
É incrível a quantidade de energia que pode brotar no peito quando se chega em determinados lugares, percebe-se temperaturas, aromas e pessoas. Dmitri ja sabia disto quando chegou na Espanha. Mas o tempo voa quando se está feliz. A Guerra Civil Espanhola chegou e foi assim que ele veio parar na América do Sul onde fez apresentações privadas aos ditadores de então da Colômbia, Peru e, por último, na Venezuela onde conheceu Papillon que havia sido recebido e protegido pelo Ditador Marcos Pérez Jiménez, que nunca tirava suas luvas brancas.
Quando nosso mestre nos revelou que havia sido convidado a dirigir o Teatro Municipal do Rio de Janeiro assim que chegou ao Brasil, nossa surpresa fincou as pontas das suas sapatilhas nos nossos ouvidos. “Asas Para o Homem” foi a coreografia idealizada por Dmitri em homenagem a Santos Dumont.
Dmitri deixou o Teatro Municipal do Rio de Janeiro e um salário equivalente ao de um Ministro na época, pois não sabia fazer política. Era artista com muito orgulho. Foi e sempre será.
Assim, atravessou a Baía de Guanabara direto para Niterói, onde, longe dos holofotes da política da Cidade Maravilhosa visada pelo mundo, acreditou poder deixar seu legado de modo feliz e pacífico. Niteroi parecia ter mais espaço para um artista verdadeiro se expressar e compartilhar sua missão.
Circe Aguiar
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